Previsões apocalípticas x Boas práticas

Em seu artigo, Bernardo Gurbanov faz uma análise sobre as boas e más notícias sobre o mercado editorial brasileiro

Enquanto ainda ecoam as matérias e artigos apocalípticos anunciando o fim das livrarias no Brasil, começa a baixar a poeira levantada perante boatos de fusões e possível migração de capitais estrangeiros.

Talvez seja hora de tentarmos, ressalto, tentarmos uma análise mais equilibrada e sistêmica.

Já nos referíamos nesta coluna em artigo de agosto de 2016 à questão da crise no mercado editorial, especialmente no que tange às livrarias e à falta de uma política pública de estímulo ao desenvolvimento e renovação do varejo de livro.

Sete meses se passaram e, de concreto, no que diz respeito à legislação e matéria impositiva, só de relevante apenas a decisão do STF de equiparação do livro eletrônico e dos e-readers ao livro impresso.

O PL 049/2015, que propõe uma lei regulatória para o mercado livreiro, hiberna em confortável estado de latência na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal.

Amplamente rejeitado na pesquisa espontânea promovida pelo site do Senado Federal, o projeto, caso acorde, deverá passar ainda pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE); de lá deve seguir para a Comissão de Educação, Cultura e Esportes (CE) e depois submetido à Câmara dos Deputados conforme artigo da redação do PublishNews postado em 08/02/2016.

E do Manual de boas práticas lançado pela ANL na convenção Nacional de Livrarias de Agosto de 2016 e assinado posteriormente pela ABEU, AEL-RJ, CBL, FNLIJ e Libre, alguém lembra?

Alguém lembra dos seis pontos propostos pelo mercado para avançar e não ficar à mercê das paquidérmicas ações do Poder Público?

1) Incentivar a bibliodiversidade com estímulo à presença e exposição de livros de editoras independentes e acadêmicas nas livrarias e nos canais de divulgação do setor.

2) Procurar mecanismos junto com o Poder Público e a iniciativa privada que promovam o aumento do número de livrarias e pontos de venda alternativos, até atingirmos a meta recomendada pela UNESCO, que é de uma livraria para cada 10 mil habitantes.

3) Privilegiar as funções específicas de cada um dos integrantes do sistema, com exceção de feiras do livro, concorrências públicas e vendas institucionais.

4) Respeitar o princípio da livre-concorrência garantida pela da Constituição Brasileira de 1988, Título VII da Ordem Econômica e Financeira, Capítulo I Dos princípios gerais da atividade econômica, artigo 170, Inciso IV, definida como a liberdade que a pessoa tem, seja ela física ou jurídica, de ofertar seus produtos e serviços sem ferir os princípios da ética, da moral e da lealdade, respeitando qualquer outro concorrente, não usando mecanismos espúrios para macular ou prejudicar o trabalho de outrem.

5) Inibir a concorrência desleal ou predatória definida como a manipulação do preço de venda ao consumidor, operando com prejuízo ou deixando de ter lucro ou mesmo aplicando preços incompatíveis com a mínima margem para a viabilização do negócio visando aumentar sua participação no mercado.

6) Zelar pela correta administração do sistema de consignação, de modo a facilitar a circulação e exibição do livro, preservar o retorno do capital investido do editor e maximizar a utilização produtiva do espaço físico dos estabelecimentos comerciais de varejo.

É necessário perceber que nem tudo é tragédia no mundo de Gutemberg.

Sim, fecharam diversas livrarias e editoras.

Sim, as vendas caíram pelo segundo ano consecutivo, assim como o PIB do país.

No entanto, devemos registrar algumas das ações positivas geradas pelo próprio mercado.

Livrarias se renovando, vide a Leonardo da Vinci no Rio de Janeiro. Crescendo como a Livraria Leitura e suas 65 lojas, Livrarias Curitiba com 27 lojas.

Proximamente, a rua da literatura em Belo Horizonte.

Prêmios inéditos como o Avena PublishNews direcionado especificamente para aqueles profissionais de vendas e marketing que cuidam da comercialização dos livros.

O projeto da Saraiva #LerFazBem que espalha na via pública Ninhos de Livros, pequenas bibliotecas colaborativas.

O projeto Navegar é Preciso da Livraria da Vila.

O concurso Prêmio Jabuti nas livrarias, estimulando a criação de vitrines temáticas para expor obras vencedoras ou finalistas do Prêmio Jabuti. Iniciativa da CBL com apoio da ANL.

Prêmio SESC de literatura, Prêmio Oceanos, Prêmio Camões e por aí vai.

O mercado brasileiro, mesmo imerso na mais profunda recessão econômica da sua história, possui uma capacidade de regeneração amplamente demonstrada no passado.

Não vai ser desta vez que deixaremos de impulsionar ações positivas.

Resta saber se as boas práticas serão de fato adotadas em benefício de todos ou se a desesperada busca por soluções corporativas unilaterais continuará provocando mais vítimas do que sobreviventes.

Compartilhe: